sexta-feira, 10 de maio de 2019

Vamos compreender porque o contingenciamento da verba federal não causa grande clamor popular.

A postagem de hoje é bastante importante, pois irá ajudar com quem não entende bem política vai conseguir ficar mais esclarecido por que o atual governo está tomando uma atitude tão anti-popular quanto o contingenciamento de verba das universidades federais.

Primeira coisa que deve ficar clara, as universidades brasileiras não são todas federais, por exemplo, USP (Universidade de São Paulo), UNESP (Universidade Estadual Paulista), UNICAMP (Universidade Estadual de Campinas), UERJ (Universidade Estadual do Rio de Janeiro), UEM (Universidade Estadual de Maringá), dentre outras, são todas mantidas com verba estadual. Em geral, você consegue identificar facilmente pela presença da letra "E", que representa "Estado ou Estadual" de forma abreviada. Já as federais terão a letra "F" na sua sigla de designação, ou seja, F de federal.

A segunda coisa que devemos entender é que grande parte da verba que fomenta as universidades, sejam elas estaduais ou federais, são proveniente de instituições de fomento, sendo as principais no território nacional a CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) e a CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), as quais são instituições federais. Entretanto também existe as instituições estaduais, como poe exemplo a FAPESP (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), FAPEMG (Fundação de Amparo à Pesquisa e do Estado de Minas Gerais), FAPERJ (Fundação de Amparo à Pesquisa e do Estado do Rio de Janeiro), FAPEMA (Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Estado do Maranhão), dente outras. 



A ideia não é agora ficar explicando como se dá esse repasse de verbas, mas sim compreender uma abordagem do fato pelo qual a medida da contingencia está em pauta no Brasil. Quem se interessar mais sobre como a pesquisa se desenvolve e como ocorre o repasse de verbas pode dar uma olhada em: CAPES diz que pode cortar bolsas de mais de 93 mil alunos e pesquisadores no segundo semestre de 2019. Nesse texto fica claro que tudo estava previsto, que realmente a ideia de um bloqueio de verbas já existia desde o ano passado.

Como um todo as universidades não são autossuficientes, elas dependem de repasses de verba dos estado ou do governo federal. Sabendo disso, podemos começar a falar de como um governo pensa.

Vale ressaltar que a ideia principal não é ficar falando de governos passados e nem do governo atual, mas sim compreender que essa atitude do contingenciamento já era prevista. Também não vou falar de minha opinião, mas sim, sobre como funciona o pensamento de um governante, indiferente de ideologias.

O texto a seguir terá uma funcionalidade semelhante ao que o livro "O Príncipe" de Nicolau Maquiavel teve ao longo dos anos. O livro tinha como intuito explicar para o governante como ele deveria agir para se manter no poder, mas ao longo do tempo, com a população tomando conhecimento de como um governante pensa e age, o livro se tornou uma ferramenta de contra-controle.

Retrato de Nicolau Maquiavel por Santi di Tito feito no século XVI.


Então vamos lá.

Para compreender melhor a necessidade da tomada de uma ação tão antipopular quanto mexer com a verba da educação e pesquisa pelo governo, devemos primeiramente olhar para o povo como mantenedor do governo. Sendo assim, o governo tem que devolver para a população serviços na área de saúde, educação e segurança, os quais foram confiados à tutela governamental e fomentados com base no pagamento de impostos. Dessa forma seria lógico que a distribuição das verbas fosse igualitária entre essas três esferas, todavia, não é assim que acontece.

Todos sabemos que os três pontos levantados são básicos, mas o raciocínio de um governante, frente a uma crise (seria leviano dizer que o Brasil não se encontra em uma crise econômica, devido tamanho o número de desempregados) é de solucionar os pontos mais imediatos, sendo que tudo o que se desenha a longo prazo acaba sendo sacrificado.

A esfera da segurança é um ponto de ação governamental de curto prazo, uma vez que sem a segurança o próprio governo se subjuga a possibilidade de perder notoriedade e soberania, sendo passível de tomada de golpes. Logo, para manter um governo funcional, o mesmo precisa ter junto as forças armadas e os corpos policiais, sendo assim, o contingenciamento de verba dessa esfera leva a queda iminente de um governo. Para compreender melhor isso, basta lembrar do que acontece quando as forças policiais fazem greve (fato esse que não pode ocorrer, pois é inconstitucional). Uma própria parcela do povo tende a tomar o controle das ruas.

A esfera da saúde também se mostra como um ponto crucial da ação governamental de curto prazo, uma vez que todos os que pagam impostos exigem o retorno de serviço que garantam sua vida. Logo, problemas na esfera de saúde sempre tendem a serem resolvidos de imediato, pois sem auxílio a saúde o povo vem a adoecer e dessa forma, menos contribuintes existirão para fomentar o governos. Obviamente, no pensamento do governante, o serviço deve ser só funcional, mas não necessariamente efetivo, dessa forma, basta contratar e ou construir instalações de saúde, com pessoal "especializado" para manter o povo em latência. Mesmo que o serviço seja ruim, respostas imediatas sempre são tomadas a fim de resolver problemas atrelados a esfera da saúde (notem que não estou falando da saúde do povo, mas da máquina institucional da saúde pública). Por isso é comum nas campanhas as promessas de construção de postos de saúde, hospitais e unidades de pronto atendimento. Em teoria, basta somente erguer o prédio para fazer com que o contribuinte acredite que está tendo o retorno de seus impostos.

Por último chegamos na esfera da educação, entretanto, ela é a única de longo prazo, uma vez que a formação das pessoas é longitudinal, ou seja, leva-se anos para que um indivíduo retribua para a população todo o investimento de impostos feito nele como um profissional (impostos que esse mesmo indivíduo pagou e paga). Para o governo se manter, não existe necessidade de um grande contingente de pessoas especializadas, uma parcela mínima já é suficiente para a manutenção da máquina estatal. Para conseguir comandar, o governante não pode ter um povo nem muito culto e nem muito desinformado. Na primeira instância, haveriam muitas críticas das atitudes do governante, já na segunda instância a comunicação entre governo e povo é prejudicada, logo, um intermediário entre o culto e o desinformado é necessário para manter o estado. Por esse fato a esfera da educação sempre é tida como uma estratégia de longo prazo. Obviamente, com uma população semi-alfabetizada, dificilmente a mesma irá se preocupar com a esfera da educação, pois no imaginário coletivo, quem já se formou no ensino médio já está alfabetizado e quem está estudando, ainda está sendo alfabetizado, o que já demonstra a efetividade da esfera educacional. 

Como um todo, para a maioria da população existem duas categorizações da educação:
1 - Ensino Fundamental: Aprender a ler e escrever e a caracterização básica da matemática, científicas naturais e dos fatos históricos e sociais.

2 - Ensino Superior: Aprender uma profissão.

Notem que a primeira categorização até pode ser aceitável, mas a segunda categorização não se limita somente ao aprendizado de uma profissão, mas também ao desenvolvimento da pesquisa. 

O primeiro grande problema desse escopo é que a pesquisa não é apresentada ao povo como uma parte integrante da dinâmica atitudinal na sociedade. Em outras palavras, a pesquisa é um bem do povo, financiada pelo povo e feita para o povo. 

O segundo grande problema é que existe uma falta de comunicação do pesquisador com todos os que financiam suas pesquisas, sendo que grande parte da produção científica não chega ao domínio público, assim, a figura do pesquisador e do estudante se tornam deturpadas ou até mesmo ausente do convívio popular.

Pela somatória desses dois problemas a Ciência é desconhecida e até mesmo não funcional. 

Trazendo agora para tomada de contingencia dos gastos públicos com a pesquisa científica, nós que estamos no mundo acadêmico podemos dizer: "Que tomada de atitude tão antipopular!", dando a impressão de ser um "tiro no pé" por parte do governo, contudo, é preciso lembrar que a população em sua grande maioria não entende ou não tem conhecimento sobre o que é Ciência, o que realmente é uma universidade e, consequentemente, o que é uma pesquisa.

Logo, infelizmente, o contingenciamento da verba federal para as universidades e para a pesquisa, só se mostra como uma consequência da crise econômica, ou algo de caráter ideológico, ou ainda vinculado à moralidade do governante para com uma parcela limitada da sociedade. Em outras palavras, os fins justificam os meios. 

Com o ideal de ser "democrático" o governante prefere manter uma ordem social do que uma ordem estratégica, uma vez que a manutenção de seu cargo se passa por atitudes imediatas em relação à maioria e não em relação à minoria.

Quem leu esse texto até aqui deve compreender um pouco melhor como um governante pensa, como ele deve agir para manter seu cargo e porque muitas vezes áreas estratégicas como a pesquisa não são tomadas como importantes para a sociedade a longo e a curto prazo. 

Em resumo: O contingenciamento da verba federal para as universidades não se caracteriza como uma atitude antipopular, mas sim lógica no que tange a manutenção do governante, uma vez que a massa nem mesmo sabe o que é uma pesquisa cientifica, onde ela é desenvolvida e para que serve.

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